sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Só existe na memória Porteiras dos verdes canaviais


Só existe na memória
Porteiras dos verdes canaviais


Você já imaginou viver em um local cercado por uma paisagem infinitamente verde, coberto por plantações de cana-de-açúcar? Já acordou respirando aquele cheiro de mel, ouvindo um som de uma sirene incessante cujo som se expande pelos vácuos da chapada? Prepare-se porque o texto que se segue trás as emoções de um viver que ficou na memória, mais que é parte da nossa história, porteiras é o seu palco.
Nos finais da década de 20 e também nos anos de 30,40e50, em tempos sofridos, onde o trabalho braçal era a arma de sobrevivência do homem e sua família, nos primórdios da colonização de nosso município, porteiras, foram chegando os fazendeiros, os famosos coronéis. Esses foram adquirindo terras, instalando suas fazendas e nelas foram plantando cana-de-açúcar. Isto porque o clima da chapada e o solo de massapé, muito contribuíram para o desenvolvimento dessa cultura. Ali, instalavam logo os engenhos. De inicio de pau e depois, com a vinda de técnicas modernas, adquiriram motores importando-os de paises estrangeiros, como o locomóvel do engenho do coronel Né Rosendo, do sitio saquinho, um Houston de 12 HP, comprado na Inglaterra por 12 contos de reis, em 1930.
Nessa época, outros engenhos foram construídos, ali mesmo, nos sítios Saquinho, Saco e Stº Antonio, todos de inicio de forma rudimentar, o famoso engenho de pau que depois foram transformados em engenhos de ferros. Em cada um desses engenhos e nos muitos outros espalhados pelo o município, eram empregados de 40 a 60 homens e a produção girava em torno de 30 a 50 cargas de rapadura por dia. Toda produção tinha destino certo, abastecer o comercio local e das cidades vizinhas.
Segundo os antigos moradores dos locais onde situava-se os engenhos a cima citados, as plantações de cana-de-açúcar era uma coisa monstruosa, era um verde que não acabava nunca, são palavras de Ranilda Tavares Neves, neta do coronel Né Rosendo, dono de um dos primeiros engenhos construídos no sitio Saquinho em 1930:
Até hoje me lembro de uma sirene que tocava de duas para as três horas da madrugada, chamando os trabalhadores para a lida, ao meio dia tocava novamente, era o descanso e ás cincos horas disparava para que estes voltassem para as suas casas.
Também o senhor Raimundo Soares, agricultor, aposentado de 88 anos, residente no sitio Saco e que também trabalhou no engenho do coronel Alboíno Miranda de 92 anos que ainda vive, nos afirmou:
Havia aqui espalhado por esse mundo de meu Deus, nas terras de porteiras uns 13 engenhos. Eu mesmo trabalhei nesse ali de seu Alboíno Miranda. Fiz de tudo, cortei cana, fui cambiteiro,  fornalheiro e caixeiro do mel de rapadura. Tempo bom, onde os meninos faziam a festa se deliciando com a garapa e as moças com o alfinim enrolado na cana. Mas, o bom mesmo desse tempo era os forrós no pé da serra, luz não havia só mesmo as lamparinas, mas havia respeito e todo mundo brincava de 6:00 da tarde as 6:00 da manhã do outro dia, pegava o sol com a mão, foi um tempo sofrido, mas que deixou saudades.
Já o seu Expedito Gabriel de 82 anos, agricultor ainda na ativa e residente no sitio Saco e que também trabalhou no engenho do saco do senhor Alboíno Miranda nos falou:
Eu comecei a trabalhar nesse engenho com 12 anos e ganhava dez tostões por dia. Nessa época trabalhava 40 homens e a produção diária era de 50 cargas de rapadura por dia. Era um tempo difícil.
A casa onde eu morava, era de taipa, tapada só ate meia parede, coberta de palha de carnaúba. Os móveis era tudo de couro, o baú, a cama, a mesa e os bancos, era de madeira. Estudo só pra rico que ia para as capitais, ou para as cidades grandes. A gente tinha que trabalhar ainda criança para ajudar os pais. Mais o bom desse tempo era o respeito que existia. Também já moço em 1956, lembro-me do 1º radio que seu Alboíno comprou. Foi um corre-corre dos diabos, todo mundo todo mundo correu pra vê e ouvir o radio. Também era de admirar, uma caixinha em cima de uma mesa, que contava fatos, cantava musicas e divertia aquele tantão de gente.
Pelos relatos dos antigos moradores entendemos que Porteiras já foi palco de um passado fundamentado na economia da cana-de-açúcar, fruto dos vastos engenhos localizados nos grandes latifúndios das fazendas dos coronéis da região. Passado esse que apesar de sofrido para aqueles menos favorecidos no caso os trabalhadores dos engenhos e seus familiares, pois garantia a sobrevivência dos mesmos, deixou marcas que vale a penas ser lembradas:
A sirene não toca mais, os meninos não estão mais lá, fazendo filas para tomar a garapa. O cheiro de mel desapareceu junto com o verde dos vastos canaviais que também não mais existem. Mas os engenhos, esses sim ainda estão lá. Porem de fogo morto, perdidos no abandono e na poeira do tempo. Só temos mesmo alguns moradores vivos para contar-nos a história.

Profª. Socorro Linard - História E.E.M. Aristarco Cardoso

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